A equipe do Educativo Flip consolida a proposta de reflorestar o imaginário e criar a oportunidade de debatermos a monocultura do pensamento com o trabalho realizado na cidade de Paraty desde a primeira edição da Flip, em 2003. Promovendo a diversidade, a acessibilidade e a inclusão, Flipinha e FlipZona se constituem como frentes de atuação que fomentam a leitura na comunidade paratiense, por meio da formação continuada de mediadores, da democratização do acesso ao livro e programação literária, da promoção de alfabetização midiática e informacional, além da valorização do patrimônio local, incluindo saberes e fazeres.
No ano de 2021 o Percurso Formativo Sementes teve início e trouxe a proposta da curadoria participativa para a programação da Flipinha e da FlipZona durante a Flip, convidando editoras, autoras, autores, ilustradoras e ilustradores a enviarem livros para compor o acervo e circularem em encontros conduzidos pela educadora Denise Col e pelo artista Luis Filipe Porto em formato híbrido. As pessoas que acompanharam a formação em mediação de leitura escolheram a composição da programação da Flipinha e estiveram nas mesas como mediadoras e mediadores. Essa primeira experiência foi online devido à pandemia de Covid-19, e ganhou novos contornos em 2022 nos encontros presenciais da Central Flipinha, tradicional ocupação da Flip na Praça da Matriz, em Paraty.
Denise atua como coordenadora pedagógica do Educativo Flip e acredita na potência do trabalho das pessoas que significam a mediação, ampliando o entendimento desse conceito para leituras de livros e de mundos. “Qual o perfil literário de professores? Nós compreendemos que no Brasil leitores têm vínculos complexos com a escola e com as obras literárias”. Se no Percurso Formativo Sementes 2023, que aconteceu no Sesc Paraty, as mestras e mestres do território e de outros lugares do país conversaram com integrantes da oficina em cinco dias de encontros diversos, agora em 2024 a intenção é ampliar as possibilidades de conexões. “A perspectiva afirmativa é presente em todas as ações, e os acontecimentos no palco do Auditório da Santa Rita no ano passado reverberam para buscarmos possibilidades de permanência, evitando a realidade efêmera da conjuntura social do nosso tempo”, afirma Denise.
Celebrando esse movimento, as ações ganharam outros espaços em virtude do termo de colaboração firmado com a Secretaria de Educação de Paraty. Desde março as escolas municipais recebem a equipe de mediação de leitura do “Sementes na Escola” para atuar com estudantes do Fundamental II. Essa é a possibilidade de manter vínculo com crianças e jovens ao longo do semestre. Para Denise, a literatura atravessa conflitos e nos questiona como lidamos com as divergências, como pensamos o currículo desenvolvimentista. Talvez a novidade mais aguardada seja a inauguração da Casa Flipeira ainda em abril. “Casa de encontro, de cultura, de vivenciarmos os livros e a mediação”, afirma.
Formação nas escolas
Diretora de Cultura e Educação da Flip, Belita Cermelli conta que a colaboração entre o Educativo Flip e a Secretaria de Educação de Paraty é imprescindível para o município porque prevê as formações em mediação de leitura, o funcionamento da Casa Flipinha FlipZona durante alguns meses, a curadoria participativa da Flipinha e ações importantes como a Operação Flipinha, doações de livros e o projeto dos Módulos Bibliotecas.
“Anos atrás nós oferecemos formações na semana pedagógica da Secretaria Municipal de Educação, e retomamos a colaboração com o conceito de integrar as formações continuadas como momento de diálogo entre a leitura e a literatura com as pessoas”. No dia 12 de abril as equipes se reúnem na formação ‘Sementeira de leitura: a mediação na prática docente’, iniciativa do Percurso Sementes que atenderá 120 servidores públicos em dois turnos na Escola Municipal Monsenhor Hélio Pires, na Praia Grande. Belita destaca que Paraty abriga um dos principais festivais literários do Brasil e do mundo. “Garantir que Paraty seja uma cidade de leitores é um desafio que cabe a todos nós de maneira permanente”, reitera.
No dia 15 de abril estudantes da Escola Municipal Pequenina Calixto receberão a ‘Operação Flipinha’, quando dois/duas autores/as conduzem as atividades e protagonizam o encontro de crianças e jovens com o conhecimento a respeito da criação literária. Os convidados dessa vez são Luiz Eduardo Anelli, paleontólogo, escritor, professor livre docente do Instituto de Geociência da USP (Universidade de São Paulo) e atual diretor da Estação Ciência da USP; e Caio Zero, artista-educador, pós-graduado na área de educação e artes visuais, que ministra aulas de arte no município do Rio de Janeiro e teve sua obra “Aqui e Aqui” em destaque na roda de conversa ‘Infâncias’, acompanhado de Isabel Malzoni na programação da Flipinha 2023.
Mediadores Sementes
As Sementes (como chamamos mediadoras/es de leitura que participam do Percurso Formativo Sementes) transformam a realidade escolar. Ao chegar na sala de aula do 6° ano da Escola Municipal Parque da Mangueira, jovens pareciam ressabiados com a presença do mediador Max Medeiros. Ou seria o pandeiro que ele tinha em mãos?
“Eu cheguei e fiquei preocupada em como seria a prova, porque não tinha estudado. Quando vi as cadeiras fora do lugar, pensei que teríamos aula de música, mas era de ler, e foi muito bom”, declara Manuela Santana Barros, 11 anos.
Bernardo Moreira Ramos, 12 anos, também achou diferente sentar em roda com os amigos para escutar sobre livros. “Achei as histórias que ele contou muito legais”.
Durante as dinâmicas e mediações, o que alegrou John Brian Augusto Nascimento, 12 anos, foi uma nova perspectiva. “Aprendi a me juntar mais com as pessoas”.
O professor Sandro Ramiro segue atento a essa nova realidade escolar. Para ele, a mediação de leitura é uma técnica interessante para estudantes assimilarem letras e imagens, lerem e verem as ilustrações como uma nova forma de lermos um livro. “Estamos sempre produzindo textos em sala de aula, e na mediação há a linguagem oral, possibilitando que as crianças e os jovens criem sobre a escrita, por exemplo quando eu mostro as ilustrações e peço que escrevam um texto em relação ao que foi desenhado no papel”. Assim, a mediação contribuiria com a oralidade para o aprendizado da escrita.
Mônica Valéria de Araújo, coordenadora pedagógica da escola, vê uma revolução positiva, porque a partir das mediações, estudantes despertam o interesse pela leitura. “Nesse pouco tempo de projeto nós nos surpreendemos com estudantes que começaram a pedir para pegar emprestados os livros da Biblioteca e professoras e professores que agora também querem dar aula na Biblioteca”. Em meios às estantes recheadas de livros, as disciplinas de matemática, ciências, educação física e outras que são parte do currículo acrescentam novos contornos ao dia a dia entre os muros das escolas.
Texto: Débora Nobre Monteiro
Fotografia: Gabriel Tye