A vida de Alice Walker coincide com as décadas de grandes transformações no debate racial nos Estados Unidos. Não espanta, portanto, que sua obra seja, para os seus leitores, um prisma de investigação da história. A coincidência entre biografia e produção ficcional, na obra de Walker, é explorada à exaustão, como se de experiências esquecidas se revelasse alguma peça capaz de reconfigurar o confuso e violento quebra cabeça que explica o passado e o presente dos negros nos Estados Unidos.
Walker nasceu em 1944, ao sul, na Geórgia. A história que se conta é de uma menina extrovertida, a mais jovem de uma família de nove irmãos em uma região do país onde ecoava-se o passado de escravidão dos negros. Embora já frequentasse a escola por iniciativa de seus pais, só foi encontrar o ofício de escritora a partir de um acidente que lhe tirou a visão de um olho. As letras, então, tornaram-se suas companheiras. Quando queria concentrar-se para escrever, Alice Walker saia da casa e alojava-se ao pé de uma árvore. Enquanto aluna universitária, foi testemunha ocular da eclosão dos movimentos pelos direitos civis, presenciando o surgimento de figuras como John Lewis e Martin Luther King Jr., que transformaram a história dos Estados Unidos de maneira definitiva. Autora de extensa obra, Walker foi a primeira autora negra a ganhar o Pulitzer de ficção, em 1983, por A cor púrpura.
Aos 77, a escritora vem à Flip também para divulgar Em busca dos jardins de nossas mães, coletânea de textos publicada em 83 e que delineia as concepções que ela tem do próprio ofício. O subtítulo, “escritos mulheristas”, indica como a obra da autora é condicionada pela sua percepção política do mundo, uma vez que o termo foi reinvindicado feminismo negro para expressar as particularidades dessa luta. Entre reflexões sociais e relatos próprios, o livro é um convite a um passeio com Walker por veredas onde ela encontra-se com algumas de suas maiores influências, como Zora Neale Hurston e Phillis Weathley, mas também sua própria mãe, que de sua casa na Geórgia, cultivando flores, ajuda-nos a entender o universo dessa grande autora da literatura mundial.